Em depoimento à Polícia Federal (PF) no âmbito do inquérito que apura suposta interferência política na instituição, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro usou a possibilidade de ser indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF) para negociar a troca no comando da corporação. É o que indica a transcrição da oitiva, obtida pela Jovem Pan. O chefe do Executivo federal depôs na noite desta quarta-feira, 3, no Palácio do Planalto, ao delegado Leopoldo Soares Lacerda, chefe da Coordenação de Inquéritos nos Tribunais Superiores (Cinq) da PF. O prazo estipulado pelo ministro Alexandre de Moraes para que o mandatário do país fosse ouvido se encerrava nesta semana.
“Que indicou o DPF Ramagem em razão da sua competência e confiança construída ao longo do trabalho de segurança pessoal do declarante durante a campanha eleitoral de 2018; que ao indicar o DPF Ramagem ao ex-ministro Sergio Moro, este teria concordado com o Presidente desde que ocorresse após a indicação do ex-ministro da Justiça à vaga no Supremo Tribunal Federal”, diz um trecho da transcrição. Segundo o presidente da República, “não havia qualquer insatisfação ou falta de confiança com o trabalho realizado pelo DPF Valeixo, apenas uma falta de interlocução”.
Bolsonaro também negou que tenha tentado interferir na Polícia Federal. “Nunca teve como intenção, com a alteração da Direção Geral, obter informações privilegiadas de investigações sigilosas ou de interferir no trabalho de Polícia Judiciária ou obtenção diretamente de relatórios produzidos pela Polícia Federal”, segue o documento. Bolsonaro pediu a Moro que trocasse o delegado Maurício Valeixo pelo então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem. Valeixo em várias fases da Lava Jato, operação pela qual Moro era responsável quando juiz federal.
O presidente também afirmou que, em seu entendimento, Moro administrava o Ministério da Justiça e Segurança Pública “sem pensar no todo, sem alinhamento com os demais ministérios e o gabinete da Presidência”. Questionado sobre a declaração feita na reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, quando afirmou “eu tenho a PF que não me dá informações”, Bolsonaro disse que “não obtinha informações de forma ágil e eficiente dos órgãos do Poder Executivo, assim como da própria Polícia Federal; que quando disse ‘informações’ se referia a relatórios de inteligências sobre fatos que necessitava para a toma de decisões e nunca informações sigilosas sobre investigações”. Segundo a transcrição da PF, Bolsonaro se incomodava com o fato de “muitas informações relevantes para a sua gestão chegavam primeiro através da imprensa, quando deveriam chegar ao seu conhecimento por meio do Serviço de Inteligência”. O inquérito que apura suposta interferência na Polícia Federal tramita no STF e está sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.