Diferentemente das outras etapas, o ensino superior já trabalhava de forma avançada com a educação de forma remota antes mesmo da pandemia do coronavírus. Um estudo realizado pela Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) registrou aumento de 17% no número de alunos matriculados no formato EAD de 2017 para 2018. O Censo Superior do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) mostrou que 43,8% dos ingressantes em 2019 se matricularam em cursos de graduação a distância. Assim, quando a Covid-19 se espalhou pelo Brasil, muitas instituições já estavam preparadas para a realização de atividades remotas. Enquanto as particulares saíram na frente no formato EAD, as federais ficaram para trás. De qualquer forma, apesar de todos os males, a pandemia trouxe aprendizados importantes para o ensino superior, que prometem modificar a forma como a graduação é oferecida no país. Segundo especialistas, o pós-pandemia promete uma introdução do ensino híbrido na maioria dos cursos do ensino superior.
Para Luiz Roberto Liza Curi, ex-presidente e conselheiro do Conselho Nacional de Educação (CNE), a maior dificuldade das instituições foi demonstrar para os estudantes que era importante continuar o curso presencial de forma não-presencial. “Esforços foram feitos pelas instituições no sentido de reordenar as estratégias metodológicas, incrementar as tecnologias de informação e comunicação e amplificar essa mediação tecnológica no processo de aprendizado para manter o estudante”, afirma. “Ao Conselho de Educação e ao MEC (Ministério da Educação) coube desenvolver as balizas regulatórias de forma a propiciar aproveitamento pleno das atividades não-presenciais, mesmo para aquelas instituições que não haviam adotado o ensino remoto”, explica Curi.
A forma como a rede privada e a rede pública lidaram com a mudança de ensino presencial para ensino remoto obviamente não foi a mesma. “Boa parte do sistema particular hoje em dia já é à distância. Inclusive, nos últimos anos, houve uma mudança muito grande no setor privado para a adoção do formato EAD. Então, para a rede privada, não houve muita mudança desse ponto de vista”, explica o sociólogo brasileiro e membro titular da Academia Brasileira de Ciências, Simon Schwartzman. Ele lembra que, apesar da experiência com o ensino remoto, as instituições particulares tiveram que lidar com um prejuízo muito maior do que a rede pública, porque com a migração do presencial para o online, muitas matrículas nas particulares foram desfeitas. “Se o setor privado não se adaptar, ele morre. O setor público já não tem esse problema, por isso mesmo as universidades públicas foram muito mais lentas, resistiram muito mais a trazer essas novas alternativas”, aponta.
Na análise de Schwartzman, os universitários de primeira viagem foram os que mais sofreram, independentemente de estarem matriculados no ensino público ou privado. “O ensino presencial é muito importante para os jovens que acabaram de sair do ensino médio. A convivência com os colegas, com professores, com o ambiente, as atividades culturais e o dia a dia na universidade são muito importantes para a formação do jovem, então não tem como substituir. Para esse tipo de público, eu acho que é uma perda”, analisa o membro titular da Academia Brasileira de Ciências. “Agora uma boa parte dos nossos alunos do ensino superior são mais velhos, já fazem cursos online, cursos à distância no setor privado, optam por cursos noturnos no ensino público. São pessoas mais velhas, que trabalham o dia todo, e, para essas pessoas, o ideal é um sistema híbrido, uma combinação de material EAD e encontros presenciais”, diz Schwartzman.
O futuro é híbrido
O sociólogo acredita que as tecnologias continuarão sendo incorporadas na educação e afirma que isso não é necessariamente ruim. “Vai haver uma mudança positiva no pós-pandemia de incorporar essas tecnologias que já existiam, mas eram muito pouco usadas”, diz. Curi vai na mesma linha e aponta os ganhos que o ano de EAD trouxe aos estudantes e aos professores. “O ensino a distância amplifica o autoaprendizado e amplia a relação dos estudantes com seus colegas, porque o formato EAD permite chat e outras formas de comunicação. Amplia também o tempo dedicado ao aprendizado, porque a flexibilidade da não-presencialidade permite isso. Você acaba tendo mais tempo para ler, para escrever e para produzir conhecimento”, explica o ex-presidente da CNE. “O resultado foi uma maior amplitude do aprendizado. O autoaprendizado foi muito importante, porque fez com os estudantes também passassem a ser mais ativos de processo e não só o aluno em sala de aula ouvindo o professor, mas interagindo mais amplamente”, avalia Curi.
Fonte: Jovem Pan