O mês de maio terminou com uma declaração inesperada do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden. Na ocasião, ele afirmou que havia instruído a agência de inteligência do país a desempenhar mais esforços na investigação sobre a origem da pandemia da Covid-19. O anúncio do presidente norte-americano ocorreu após um relatório de Estado constatar que cientistas do Instituto de Virologia de Wuhan, na China, tiveram que ser hospitalizados em novembro de 2019. Os primeiros diagnósticos do coronavírus foram notificados pelo governo chinês em dezembro de 2019, em Wuhan, onde fica o Instituto de Virologia. A partir de então, a Covid-19 se espalhou pelo mundo até ser classificada como pandemia pela OMS.
Com a informação, os EUA intensificaram os estudos para compreender se o vírus surgiu naturalmente do contato humano com animais infectados ou se teria sido o resultado de um acidente de laboratório no Instituto de Wuhan, onde pesquisas sobre o coronavírus estavam em desenvolvimento. Nas últimas semanas, a questão tem chamado a atenção de autoridades globais, que continuam procurando respostas sobre a pandemia. Por isso, segundo a mídia internacional, a União Europeia deve se aliar aos Estados Unidos em uma nova iniciativa para investigar as origens da Covid-19. Os jornais estadunidenses apontam que os países pretendem apresentar aos demais líderes mundiais uma declaração solicitando à China “avanços no estudo sobre as origens do coronavírus”, demandando que uma pesquisa “livre de interferência” seja conduzida por cientistas da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ao passo que nações pressionam para encontrar respostas sobre as origens naturais ou artificiais do novo coronavírus, o governo chinês rejeita qualquer conexão entre a doença e as pesquisas realizadas em laboratório.
Entenda o que se sabe sobre o laboratório de Wuhan:
Instituto de Virologia de Wuhan
Fundado em 1956, o Instituto de Virologia de Wuhan é uma instituição científica voltada para estudos de virologia, microbiologia aplicada e biotecnologia. Atualmente, o laboratório localizado no distrito de Jiangxi, em Wuhan, é administrado pela Academia de Ciências da China e está entre os 50 do mundo que possui o nível mais alto de biossegurança. Além de pesquisadores nacionais, a instituição recebe cientistas de todo o mundo para investigar doenças infecciosas e possíveis respostas a elas. Desde 2012, o local dispõe de um laboratório de alta segurança para patógenos de classe 3, onde diversos vírus são pesquisados — inclusive, o coronavírus. No site oficial, o laboratório informa que “com o desenvolvimento de pesquisa apropriadas e o recrutamento de talentos inovadores, o estudo patogênico de doenças infecciosas emergentes tornou-se um dos principais campos de pesquisas da instituição. Assim, grandes conquistas foram alcançadas em estudos de origem animal do coronavírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV) e do vírus da influenza aviária”. Além do laboratório de alta segurança para patógenos de classe 3, a organização também conta com um local inaugurado em colaboração com a França para estudar patógenos de classe 4, mais perigosos e que ainda não têm vacinas ou tratamentos disponíveis, como o ebola.
Criação artificial de um novo vírus
Formado por quinze cientistas de diversos países, um grupo de pesquisadores criou um vírus artificial a partir da junção de dois coronavírus diferentes no laboratório de Wuhan em 2015. Segundo o estudo publicado na revista científica Nature, o experimento resultou em uma versão mais perigosa do vírus, apresentando inclusive potencial de se tornar uma pandemia. Em outra pesquisa parecida com a publicada pela revista Nature, cientistas estudavam o coronavírus em Wuhan com o suposto financiamento do imunologista Anthony Fauci, atual diretor dos Institutos Nacionais de Alergia e Doenças Infecciosas do governo estadunidense. Apesar destas informações, a OMS afirma que a teoria de vazamento da doença do laboratório é “extremamente improvável”. A instituição global de saúde aponta para a hipótese de que os seres humanos tenham se infectado pelo vírus por meio do contato com um animal intermediário, por sua vez infectado por um morcego.
Pesquisadores doentes
O jornal estadunidense “The Wall Street Journal” publicou outra informação que alimenta as teorias relacionadas ao surgimento da pandemia através de uma possível fuga de vírus do laboratório. A mídia cita um relatório produzido pela inteligência dos Estados Unidos, no qual há a indicação de que ao menos três pesquisadores do laboratório de Virologia de Wuhan foram internados com sintomas semelhantes aos da Covid-19 em novembro de 2019, antes do primeiro surto da doença na China.
Como surge um vírus?
Causadores de diversas doenças, os vírus são organismos pequenos e simples, já que não possuem células. Apesar de serem acelulares, eles dependem de células para viver e se multiplicar. Por isso, parasitam as células de outros seres vivos. “O surgimento dos vírus é uma questão que permanece em aberto, apesar de ser constantemente debatida na comunidade científica. Sabemos que eles surgiram há bilhões de anos, antes dos seres humanos, e que muitos ainda encontram-se espalhados em zonas desconhecidas ou não habitadas por humanos. O deslocamento destes vírus da natureza para o organismo humano geralmente acontece quando os indivíduos decidem avançar sobre estas zonas não exploradas, afinal os vírus que ali estão acabam se adaptando às novas condições dos locais e podem infectar as pessoas. Além disso, novos organismos também podem surgir da junção entre duas espécies diferentes de vírus que possuam algum tipo de similaridade”, explicou o biomédico e virologista Raphael Rangel à Jovem Pan. Para dar um exemplo da situação, o especialista afirmou que novas doenças podem surgir a partir do desmatamento da Amazônia. “A floresta é uma ‘caixa de pandora’, não sabemos todas as espécies que estão ali. Em algum momento, o desmatamento desenfreado nos levará a locais antes não explorados e haverá o surgimento de doenças virais ou microbiológicas”, completou.
Vírus tão letais quanto a Covid-19 costumam surgir naturalmente?
Segundo Raphael Rangel, é comum que vírus altamente letais e perigosos apareçam na natureza, como a Covid-19. “É da própria natureza do vírus se multiplicar rapidamente e sofrer mutações que permitam sua adaptação ao ambiente, dando origem assim a doenças muito letais, como a ebola, a varíola, o sarampo ou a AIDS.”
Novos vírus podem surgir a partir da Covid-19?
O especialista analisa que sim, novos vírus podem se originar da Covid-19, porque estes organismos sofrem mutações a todo o tempo para continuarem vivos. “É possível que apareçam outros vírus através das mutações do próprio novo coronavírus. Quanto mais a doença circular, mais mutações ocorrerão. Para que consigamos barrar a circulação do vírus, de novas mutações, de novas variantes e, por fim, novas doenças, precisamos tomar os cuidados necessários”. Ele reforçou a necessidade do distanciamento social, do uso de máscaras e da vacinação em massa para frear o avanço da doença.
É possível identificar se a Covid-19 surgiu artificialmente?
“Os pesquisadores conseguem identificar se o vírus surgiu naturalmente ou artificialmente através da análise de sua sequência genética. Isso porque, conforme o material genético do vírus estiver disposto, é possível traçar se aquela mutação teria chance de surgir de forma natural ou apenas montada em laboratório”, explicou o biomédico. Cientistas do laboratório de Wuhan analisam que o novo coronavírus é originário dos morcegos, já que possui uma estrutura genética semelhante a dos outros coronavírus. “A hipótese levantada recentemente com relação a origem do novo coronavírus gira em torno de um escape laboratorial. Existem muitos tipos de micro-organismos guardados em laboratórios que podem ser usados como armas biológicas — por exemplo, a bactéria Antraz. Nos laboratórios de Wuhan, eles adotam a segurança ‘GNB4’ para que estes micro-organismos não escapem e infectem as pessoas. O que pode ter acontecido com a Covid-19, de fato, é um escape laboratorial. Os pesquisadores desenvolviam vários estudos com o vírus e, por algum motivo, ele pode ter escapado. Esta é uma hipótese que está sendo investigado, mas os fatos mais fortes apontam que realmente a origem do vírus é animal”, disse Raphael.
Fonte: Jovem Pan