Em uma votação apertada, a Câmara dos Deputados aprovou, por 312 votos a 144, a PEC dos Precatórios, que adia o pagamento de dívidas reconhecidas pela Justiça, muda a regra do teto de gastos e abre espaço fiscal para o pagamento do Auxílio Brasil em 2022. Entre os partidos da oposição, o PDT foi o único a orientar o voto “sim”. Além disso, 15 dos 24 pedetistas da Casa foram favoráveis à proposta, o que, na prática, garantiu a vitória do governo Bolsonaro, uma vez que o projeto conquistou apenas quatro votos a mais do que o necessário. O posicionamento dos parlamentares causou uma reação imediata: o ex-ministro Ciro Gomes, candidato da sigla à Presidência da República, foi às redes associar anunciar que suspendeu a sua pré-candidatura até que a bancada reavalie a sua posição.
O deputado federal Túlio Gadêlha (PDT-PE) foi um dos seis integrantes da sigla que votou contra o texto. Em entrevista à Jovem Pan, ele afirmou a decisão dos colegas foi “grave”, mas ressaltou que aposta em uma reviravolta e na derrota do Palácio do Planalto na votação em segundo turno, que deve ocorrer na terça-feira, 9. “O segundo-turno vem aí e a posição de Ciro Gomes ajuda bastante o PDT a consolidar esses votos contrários à PEC”, diz. Gadêlha também acrescenta que havia outras maneiras de garantir o pagamento do benefício social. “O que o governo não pode é jogar os professores contra as pessoas que precisam deste auxílio”, avalia. Confira abaixo os principais trechos da entrevista:
Por quais razões o senhor votou contra a PEC dos Precatórios? Primeiro, por uma questão de princípios. O PDT é conhecido como o partido da educação, vários professores do Estado entraram em contato com o nosso mandato. Essa foi uma pauta central para os professores, para muito gestores, que pretendem investir os recursos dos precatórios nas escolas, para os prefeitos de pequenas cidades. Então, essa PEC, a PEC do calote, desarruma todo um planejamento orçamentário que havia sido desenhado para o próximo ano e parcela em três anos esses recursos, o que prejudica a educação, os professores e os pequenos municípios.
Durante a sessão de ontem, o líder do partido falou sobre a importância do acordo costurado com o governo, que garantiria o parcelamento dos precatórios nos próximos três anos. É um acordo benéfico? Benéfico para quem? É o que temos que perguntar sempre. A narrativa que o governo tentou trazer é que o objetivo da proposta era liberar cerca de 90 bilhões de reais para viabilizar o Auxílio Brasil, o programa que o governo federal tenta construir com o fim do Bolsa Família. Mas isso não é verdade. Conseguimos debater isso com profundidade ontem e provamos que, se a MP 1061 tivesse sido aprovada, abriria créditos extraordinários para o pagamento do benefício. Não precisaria tirar recursos dos precatórios para isso. O principal argumento do governo é uma falácia e falamos isso na reunião da bancada. A gente não poderia cair na narrativa de jogar professores contra os miseráveis, as pessoas que precisam do Auxílio Brasil. Tendo isso como premissa, a gente vê que os recursos dos precatórios são importantes para quem espera receber, para a educação e, por isso, pelo compromisso programático que o PDT tem com a educação, o partido nunca deveria ter votado a votar dessa PEC.
Nas redes sociais, apoiadores do governo têm dito que, ao votarem contra a PEC dos Precatórios, os partidos de esquerda votaram contra milhões de pessoas que estão passando fome no país. Como o senhor rebate esse tipo de afirmação? Não fomos contra programa social algum. O governo Bolsonaro e os deputados bolsonaristas é que foram contra um programa que existe há 18 anos, o Bolsa Família. Eles acabaram com o Bolsa Família. É uma falácia dizer que Bolsa Família é um programa de mera assistência social. O Bolsa Família ajudou a combater a desigualdade no Brasil, foi premiado internacionalmente, inclusive pela ONU. Se o governo planeja fazer um programa para substituí-lo, ele precisa definir de onde vêm esses fundos. E já mostramos que isso é possível através de créditos extraordinários. A MP 1061 fala sobre isso. Tivemos 177 bilhões que vieram de 29 fundos diferentes, vimos, inclusive, que esses recursos estavam retirados no Tesouro. Recursos existem. O que o governo não pode fazer é jogar professores contra miseráveis. Essa foi a narrativa utilizada para tentar constranger quem foi contra.
O senhor disse que o PDT não poderia ter votado a favor da PEC, mas a sigla foi o fiel da balança para a aprovação da proposta. Foi o maior erro da história recente do partido? Não foi o maior erro do PDT porque, nesse caso, ainda há como reparar. Existe a votação em segundo turno. Esses 15 deputados que votaram com o governo vão poder repensar sobre o que fizeram. Não foi o maior erro mas foi um erro grave. O principal nome do partido, o presidenciável Ciro Gomes, se posicionou de forma contrária. Nossa expectativa é que os deputados façam essa avaliação e compreendam a importância do projeto nacional que o PDT defende, releiam o programa do partido e votem contrário a essa PEC.
O senhor foi pego de surpresa com a suspensão da pré-candidatura de Ciro Gomes? Não, porque ele já havia se posicionado publicamente contra a PEC. Eu sabia que ele era contrário à matéria. Nenhum parlamentar foi pego de surpresa. O que causou surpresa foi o acordo feito com o governo. Mas, como disse, ainda há tempo para que revejam esse posicionamento e o placar conquistado por Arthur Lira.
O senhor está otimista? Acredita que a maioria da bancada mudará de ideia? Eu sou bem otimista. Sei que muitos parlamentares cederam à pressão, existe uma pressão muito grande por parte da presidência da Casa. A gente sabe como Lira joga, mas isso faz parte do jogo. Sou otimista porque esses parlamentares têm compromisso com o projeto nacional de desenvolvimento de Ciro Gomes, eles têm compromisso com o PDT, são dirigentes partidários. Certamente vão rever seus posicionamentos. Acredito que, destes 15 votos, vamos conseguir trazer 10 de volta para o campo de oposição, que é onde o PDT sempre esteve.
O governo prometeu liberar emendas represadas e ameaçou barrar recursos de parlamentares que não votassem a favor da PEC. O senhor foi procurado por algum integrante do Palácio? Nunca fui procurado e acho que é porque já sabem a resposta que eu daria. Não quero ser procurado e faço questão de deixar isso claro. Sei que faz parte do jogo, mas não faz parte do meu jeito de fazer política.
Se a PEC for aprovada em segundo turno, qual a expectativa do senhor sobre a tramitação da proposta no Senado? Será a última trincheira da oposição? No Senado é mais difícil ainda. Além disso, se passar no Senado, o que acho muito difícil, ainda tem a judicialização dessa PEC, porque esses recursos estavam garantidos pela Justiça e muitos parlamentares pretendem judicializar caso o projeto seja aprovado. Mas eu acredito que não passará nem na Câmara. O segundo-turno vem aí e a posição de Ciro Gomes ajuda bastante o PDT a consolidar esses votos contrários à PEC.
Dentro da oposição, o PSB também entregou 10 votos ao governo. O que podemos esperar da oposição? Há algum trabalho para virar votos no PSB? Eu não crio expectativas nos votos de outros partidos, não crio expectativa alguma. Mas sei que parlamentares do PSB, como Molon e Freixo, estão comprometidos em virar esses votos, estão constantemente em diálogo com a bancada. Mas se o PDT reverter os 10, temos a garantia de derrota de Arthur Lira, porque ele não terá de onde tirar os votos que faltarão.