O PSL, partido que abrigou o então deputado federal Jair Bolsonaro para a campanha presidencial de 2018, saiu da condição de nanico ao posto de segunda maior bancada da Câmara dos Deputados e conquistou uma expressiva parcela do fundo presidencial graças à onda bolsonarista. A sigla se prepara, agora, para se “desbolsonarizar”. Este plano, cuja meta mais ambiciosa é tornar o apresentador José Luiz Datena um candidato competitivo ao Palácio do Planalto, envolve também o expurgo de parlamentares radicais, a filiação de quadros de outras legendas e, também, uma aproximação com o Movimento Brasil Livre (MBL). Na cúpula do partido, prevalece a avaliação de que a legenda vai se manter coerente com suas bandeiras. “Agora a gente parte para um novo momento, um novo ciclo. O partido se organiza, busca esta desbolsonarização, para atrair quadros que defendam o programa do partido, que sempre foram nossos pilares, as chaves-mestras”, disse em entrevista à Jovem Pan o vice-presidente nacional do PSL, o deputado federal Júnior Bozzella (PSL-SP).
Quando Bolsonaro se filiou ao PSL, o atual presidente da República firmou um pacto com o cacique da sigla, o deputado federal Luciano Bivar (PSL-PE). A carta de filiação previa a defesa do Estado democrático, das instituições e da harmonia entre os três Poderes. Quase três anos depois da eleição de outubro de 2018, a direção do partido entende que o mandatário do país, que anunciou sua desfiliação em novembro de 2019, e seus aliados, que permanecem filiados, renunciaram ao que foi acordado. À época, a saída de Bolsonaro resultou em um racha interno: a partir daquele momento, o PSL se dividiu entre bolsonaristas e bivaristas, que passaram a se digladiar, por exemplo, na disputa pela liderança partidária na Câmara dos Deputados. Entre os parlamentares mais alinhados ao capitão reformado do Exército estão, por exemplo, Eduardo Bolsonaro, Carla Zambelli, Bibo Nunes e Carlos Jordy. Em paralelo, Bozzella apresentou uma representação à Executiva Nacional do partido pedindo a expulsão destes deputados, a quem chama de radicais. Também por isso, o vice-presidente da legenda faz questão de ressaltar que a cisão com o bolsonarismo ocorre há tempos. “Isso não ocorre de hoje, principalmente em São Paulo, onde expulsamos [os deputados estaduais] Gil Diniz, Douglas Garcia, Valeria Bolsonaro”, cita.
Em razão disso, há um consenso dentro do PSL: não há mais clima para os bolsonaristas. Quando Bolsonaro ainda negociava sua filiação ao Patriota, em junho, ele se reuniu com deputados aliados no Palácio da Alvorada para tratar sobre seu futuro na política. À Jovem Pan, o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ), admitiu que aguardaria a janela partidária, em março de 2022, para deixar o partido – a intenção é buscar abrigo na nova legenda do presidente da República. Bozzella estima que aproximadamente 20 deputados deixarão a agremiação no primeiro trimestre do ano que vem. “Não faz sentido nenhum permanecer. A pior ambição é colher frutos do que você não plantou. Esse pessoal plantou discórdia, radicalismo, desferiram ataques ferozes contra a nossa representação máxima [Bivar]. Não faz sentido ficar. A não ser que mudem de opinião, mas, por mais arrependidos que estejam, não conseguem voltar atrás, eles só têm um projeto de poder. É oportunismo apoiar o Bolsonaro. Se não fizerem isso, não terão outro nicho para se agarrar. Por outro lado, se ficarem no PSL, demonstram que só querem usar o partido”, disse à reportagem.
Saem os bolsonaristas, entram deputados de outras siglas. O PSL tem tratativas avançadas para filiar, ao menos, seis parlamentares: Elmar Nascimento (DEM-BA), Acácio Favacho (PROS-AP), Celso Sabino (PSDB-PA), Clarissa Garotinho (PROS-RJ), Pedro Lucas Fernandes (PTB-MA) e Kim Kataguiri (DEM-SP). A vinda de Kataguiri, inclusive, resulta de uma aproximação do partido com o Movimento Brasil Livre (MBL). A legenda comandada por Luciano Bivar já filiou o vereador de São Paulo Rubinho Nunes, um dos cofundadores do MBL e sonha em lançar o deputado estadual Arthur do Val (Patriota), conhecido como “Mamãe Falei”, como candidato ao governo do Estado de São Paulo nas eleições do ano que vem. “São quadros equilibrados, racionais e que praticam a boa política. Prestam um bom serviço à sociedade e defendem o que defendemos: as bandeiras da economia liberal, da segurança pública e de um Estado democrático coerente. Rubinho é vereador, Arthur é deputado estadual, foi extremamente bem na eleição da Prefeitura, sem tempo de televisão, sem grandes recursos. O MBL agrega, porque esteve em momentos importantes da sociedade, defendeu o impeachment de Dilma e agora defende o impeachment de Bolsonaro, mantendo sua coerência”, avalia Bozzella.
Dono da segunda maior fatia do fundo eleitoral, o PSL tem como objetivo principal manter e, se possível, expandir suas bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Há, porém, um fator que faz os dirigentes sonharem em repetir o feito de 2018, quando o partido chegou à Presidência da República: a filiação de José Luiz Datena. Dentro da sigla, prevalece o entendimento de que o apresentador e jornalista tem a capilaridade necessária para um candidato da chamada “terceira via”. Sob reserva, um interlocutor de Luciano Bivar faz a seguinte avaliação: “O governador [de São Paulo] João Doria é um nome forte no Sudeste, mas é totalmente desconhecido no Nordeste. Alguém conhece o [governador do Rio Grande do Sul] Eduardo Leite fora do Sul do país? O Datena aparece todos os dias na televisão dos brasileiros, de Norte a Sul”. Por isso, a legenda tem testado o seu nome em pesquisas de intenção de voto. Nesta quinta-feira, 29, como a Jovem Pan mostrou, foi divulgado um levantamento no qual o apresentador aparece na terceira colocação da disputa presidencial – se o pleito fosse hoje, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria eleito. Seja como for, uma ala do PSL, que abrigou Bolsonaro em 2018, hoje trabalha pelo seu impeachment – Bozzella participou da manifestação que pedia a destituição do presidente da República no dia 3 de julho e convocou, ao lado do MBL e do Vem Pra Rua, um ato para o dia 12 de setembro. São as voltas que a política dá.