Nesta terça-feira, 23, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou a análise do pedido de suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro no caso do tríplex do Guarujá, realizado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O julgamento havia sido suspenso em dezembro de 2018, após um pedido de vista do ministro Nunes Marques, que avaliou que teve um período “extremamente curto” para conhecer os detalhes da ação. O placar final foi de 3 votos a 2 contra o ex-magistrado: Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia votaram contra Moro, e Kassio Nunes Marques e Edson Fachin votaram a favor.
A declaração de suspeição anula todas as decisões do juiz, impedindo também a convalidação de atos e provas. No caso do tríplex do Guarujá, todas as decisões de Moro seriam invalidadas, incluindo provas, depoimentos, recebimento de denúncia e audiências, por exemplo. Quando o julgamento foi iniciado, em dezembro de 2018, a ministra Cármen Lúcia havia seguido o relator da Operação Lava Jato no Supremo, ministro Edson Fachin. Na sessão do dia 9 de março, porém, afirmou que apresentaria um novo voto. “É certo que outros dados que foram anexados aos autos levaram a uma combinação para mim diferente”, disse na tarde desta terça-feira. A ministra ressaltou, no entanto, que não se baseou nas mensagens hackeadas dos celulares dos promotores da força-tarefa. “O que se põe é algo que para mim é basilar e que está na pauta desde o primeiro momento. Todos têm direito a um julgamento justo, com devido processo legal e a devida imparcialidade do juiz”, afirmou.
O que significa a suspeição de Moro?
Apesar da decisão sobre a suspeição de moro da Segunda Turma ser relativa apenas ao caso do tríplex do Guarujá, ela deve ser aplicada a outras ações em que Lula foi julgado por Moro ou nas quais o ex-juiz assumiu a maior parte dos atos processuais. Na prática, a declaração de suspeição anula todas as decisões do juiz relativas a Lula, impedindo também a convalidação de atos e provas. No caso do tríplex do Guarujá, todas as decisões de Moro seriam invalidadas, incluindo provas, depoimentos, recebimento de denúncia e audiências, por exemplo. Considerando que as provas foram invalidadas e que as investigações de algum processo iniciam-se a partir do momento em que o Ministério Público Federal (MPF) aceita denúncias, até mesmo este processo deverá ser refeito na Justiça Federal do Distrito Federal.
Moro também pode ter de arcar com as custas do processo. Em seu voto, o ministro Gilmar Mendes defendeu essa possibilidade – ele foi seguido pelo ministro Ricardo Lewandowski. É importante ressaltar que o ex-juiz federal foi declarado suspeito na condução dos processos relacionados a Lula, portanto isso não significa que suas decisões em outros casos serão anulados – a análise de sua conduta só ocorrerá se os outros réus acionarem a Justiça. A defesa do ex-deputado federal Eduardo Cunha já entrou com pedido para que Moro seja considerado suspeito nos julgamentos que determinaram sua condenação. No entanto, atos de outros juízes que atuaram na Operação Lava Jato só serão mantidos se não forem prejudicados por decisões de um magistrado suspeito. Ou seja, a sentença dada por um juiz, em uma denúncia aceita por Moro, será anulada por ato subsequente.
Por que os ministros do STF consideraram Moro suspeito?
O debate em torno da suspeição de um magistrado analisa sua parcialidade frente ao processo conduzido. Ou seja, uma vez que um juiz deve ser imparcial e manter uma certa distância dos casos que julga, quando este papel não é desempenhado corretamente devido a conflito de interesses, o magistrado pode auto declarar-se suspeito ou ser declarado suspeito, como ocorreu com o ex-juiz Sergio Moro nesta terça-feira, 23. Portanto, a decisão da Suprema Corte indica que Moro não tinha imparcialidade suficiente para analisar os processos contra Lula.
A defesa do ex-presidente embasou o pedido de suspeição de Moro nos arquivos de conversas que revelam que ex-juiz mantinha conversas com procuradores. A troca de mensagens foi divulgada por hackers presos na Operação Spoofing da Polícia Federal (PF). Além das conversas, os advogados de Lula citam outros indícios que justificariam sua suspeição, como a decisão de Moro de aceitar o convite para integrar o governo Bolsonaro e o grampo instalado no escritório Teixeira Martins Advogados, ainda no decorrer dos processos, para que a estratégia de defesa do ex-presidente fosse monitorada pela força-tarefa da Lava Jato.
O que acontece com Lula? Ele disputará as eleições de 2022?
A decisão torna o petista elegível e é encarada como mais um golpe na reputação da força-tarefa da Lava Jato, que investigou casos de corrupção no Brasil. A partir de agora, porém, uma série de trâmites legais realocados à Justiça Federal do Distrito Federal podem definir o julgamento, condenação ou até mesmo a elegibilidade do ex-presidente. O especialista em direito Constitucional Acácio Miranda da Silva Filho acha “pouco provável” que Lula não dispute o pleito do ano que vem porque, para que ele seja considerado inelegível, é necessária uma condenação em segunda instância. “Neste momento ele não tem sequer um processo em primeira instância. É necessário que seja cumprido um número de etapas, e sabemos que o sistema judicial não é necessariamente célere. Então, acho pouco provável que exista uma condenação e uma confirmação dessa condenação em um prazo inferior a dois anos”, afirmou.
O advogado Savio Chalita concorda que o petista poderá compor o quadro de candidatos à Presidência no pleito eleitoral de 2022. Isso porque o fato do ex-presidente ter processos correndo na Justiça não o impede de exercer seus poderes políticos. “A simples existência de ação judicial não acarreta na retirada de seus poderes políticos. A inelegibilidade de Lula, considerando a situação das últimas eleições presidenciais, apenas existia em razão da condenação que havia sido confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região. Ou seja, um órgão colegiado. Com a retomada da ação penal desde o início, a hipótese de inelegibilidade não mais existe”, disse Chalita.