Vítimas de abuso por padres na Itália pedem investigação independente

Nove organizações aderiram à campanha chamada "Além do silêncio" para solicitar a instalação de uma comissão para investigar os casos.

Associações de vítimas de agressão sexual cometidas por clérigos na Itália lançaram uma campanha nesta terça-feira, 15, para pedir uma investigação independente sobre abusos contra menores, cometidos por religiosos a poucos quilômetros do Vaticano. Para as associações, o assunto permanece tabu, então elas pedem mais disposição por parte da Igreja italiana para trazer à luz décadas de abuso e sofrimento. Nove organizações aderiram à campanha chamada “Além do silêncio” para solicitar a instalação de uma comissão para investigar os casos, como aconteceu na França e na Alemanha

“O governo deve agir, deve aproveitar o impulso criado por investigações imparciais em outros países”, disse Francesco Zanardi, fundador de uma das principais associações de vítimas, a Rete l’Abuso (Rede de abuso). “Se a Itália não fizer isso agora, temo que nunca o fará”, disse Zanardi, que foi abusado por um padre quando adolescente. Investigações realizadas nos Estados Unidos, na Europa e na Austrália revelaram a magnitude do fenômeno, bem como a cultura de acobertamento que impera há décadas. Segundo a Rete L’Abuso, mais de 300 padres foram acusados, ou condenados, por abuso sexual na Itália nos últimos 15 anos, de um total de 50 mil padres em toda península. Estes são números imprecisos, devido à ausência de relatórios e de investigações independentes

Uma base de dados

Em resposta, o semanário italiano “Left” anunciou que, a partir de 18 de fevereiro, abrirá um banco de dados com os nomes dos religiosos condenados e investigados. Para isso, contará com informações das associações. “Queremos preencher um vazio. Tanta falta de atenção é inaceitável”, disse Federico Tulli, da redação da revista. Algumas vítimas denunciaram a indiferença da hierarquia da igreja italiana e do Judiciário diante desse drama. “Mesmo entre os magistrados há relutância”, disse Zanardi. O jovem siciliano Antonio Messina, que sofreu abusos entre 2009 e 2013, denunciou não apenas o padre pedófilo, mas também o bispo de sua região, que acobertou seu caso e transferiu o agressor para outra sede, onde continuou mantendo contato com jovens. “Não quero que o que aconteceu comigo aconteça com outros jovens. É o meu objetivo”, afirmou em entrevista coletiva online.

Membro da Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores, diretor do Instituto de Antropologia para a Prevenção do Abuso e um dos conselheiros mais próximos do papa Francisco, o jesuíta Hans Zollner admitiu, em recente entrevista, a necessidade de uma investigação. “Provavelmente há padres que cometeram abusos e continuam vivendo sem que ninguém os incomode”, disse ele. O papa Francisco, que repetidamente expressou vergonha pelo abuso sexual de crianças por parte do clero católico, mudou a lei para endurecer a punição. Na segunda-feira, 14, simplificou os procedimentos do Vaticano para investigar as acusações. A reforma divide a poderosa Congregação para a Doutrina da Fé em duas seções que tratarão, separadamente, de questões doutrinárias e disciplinares. Hoje, a instituição é responsável por julgar os padres que foram acusados de abuso sexual de menores e tem cerca de 20 membros dedicados quase que exclusivamente a essa tarefa.

Zanardi acredita, no entanto, que qualquer investigação deve ser independente: “Eu teria pouca fé” em uma investigação interna, reconheceu. A Igreja Católica italiana mantém grande influência, e dois terços da população são fiéis, de acordo com uma pesquisa de 2019. “Há um silêncio total na mídia italiana e no governo em Roma”, lamentou Zanardi. “Sem ninguém exigindo ação, a Conferência Episcopal Italiana faz o que quer”, completou.

*Com informações da AFP


Fonte: Jovem Pan

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