Lago de chocolate, árvores feitas de doces, vaca que dá milk-shake… Willy Wonka diz que tudo em sua fábrica é fruto da sua imaginação, e o espetáculo “Charlie e a Fantástica Fábrica de Chocolate” consegue transportar o público para esse universo mágico. Em cartaz no Teatro Renault, em São Paulo, o musical encanta com uma história já conhecida e com elementos visuais como um elevador transparente que voa em cena. Com uma versão original – e mais requintada que as montagens da Broadway e de Londres –, o espetáculo possui cenários e figurinos exclusivos. “Não é uma réplica, o Instituto Artium de Cultura comprou o título e desenvolveu o projeto do zero. Foram contratados cenógrafo, desenhador de som e de luz e toda a parte técnica. O desafio é receber o desenho de como o cenógrafo imagina os cenários e passar isso para a construção física”, explica o diretor técnico Caio Malfatti em entrevista à Jovem Pan.
O cenógrafo americano Michael Carnahan, contratado pela produtora brasileira, ousou no projeto e a sala de chocolate, que surge no começo do segundo ato, foi um dos maiores desafios do projeto. “Existem limitações por causa do tamanho do palco do teatro. A ideia original era ter literalmente uma piscina de chocolate, mas não teve como fazer porque é preciso pensar no tamanho e no movimento desses elementos em cena.” A parte do cenário que fica em frente ao palco foi outro desafio, pois nela existem TV’s e elementos que se movimentam durante o show. O que chama a atenção do público, no entanto, é o elevador transparente que parece voar no palco sem estar preso a nenhum cabo. Ao ver a cena é inevitável não se questionar: como isso é possível? Caio deu detalhes com exclusividade de como essa magia acontece.
“Existe um truque visual. Esse sistema de voo é de uma empresa dos Estados Unidos que nós contratamos, eles são especializados em fazer objetos e pessoas voarem em cena, então é um sistema que vem de fora, assim como o engenheiro que instala. Já o elevador foi a gente que desenvolveu e construímos de acordo com a especificação técnica do cenógrafo. Ele queria algo totalmente transparente”, conta Caio. O elevador possui uma estrutura metálica de acrílico e é preso por quatro cabos de aço. “Esses cabos são dessa empresa, que é a única que tem essa tecnologia. Eles levam um banho de ácido e oxidam, ficando escurecidos. Com o jogo de luz certo, as pessoas têm a ilusão de que não tem nada pendurado no elevador.” A empresa em questão é a Fly by Foy, responsável pelos voos dos espetáculos “Harry Potter e a Criança Amaldiçoada”, “Billy Elliot” e “Priscilla, a Rainha do Deserto”.
No palco, o elevador alcança sete metros de altura por uma questão de segurança dos atores, mas ele pode atingir até 18 metros. A manutenção precisa ser diária e um alpinista profissional ajuda a checar se todo o sistema e a parte mecânica estão funcionando corretamente. “É raro dar algum problema, o sistema da empresa possui redundância para praticamente tudo, ou seja, é tudo duplicado, então por mais que haja problema em alguma peça, motor ou cabos, tem as reservas. Esse sistema permite continuar o show mesmo que algo falhe na hora no espetáculo, pois podemos fazer a manutenção depois. Tudo foi pensado para trazer magia ao espetáculo e deixar o público com aquela pulga atrás da orelha.” Os atores ficam presos por um cinto no elevador, mas isso também não fica aparente para o público. “A primeira vez que voei fiquei morrendo de medo de cair, tenho medo de altura. Agora estou ficando mais tranquilo. Além desse nervosismo de voar, o cinto é muito ruim. Eu nem me mexo na hora de cantar, mas eu amo fazer essa cena”, comenta Leonardo Freire, que alterna o papel de Charlie com os atores Felipe Costa e Davi Martins.
Desafios da pandemia
O musical estava prestes a estrear em 2020 quando a pandemia paralisou o mundo. Foram meses de espera e, quando o aguardado retorno foi anunciado, Leonardo descobriu que assumiria o papel-título do musical. A princípio, o artista interpretaria Mike Tevê, mas após um ano e meio o ator Pedro Sousa, que seria o Charlie, ficou grande para viver o humilde menino que sonha em conhecer a fábrica de chocolate. A alternativa foi trocar os atores de papéis. “É uma responsabilidade muito grande ser protagonista de uma hora para outra. Antes eu ia aparecer poucas vezes, agora participo do espetáculo inteiro. O Mike e o Charlie são muito diferentes, eles possuem linguagens corporais diferentes e isso foi o mais difícil para mim, fazer essa mudança. Foi corrido, mas está sendo muito bom.” Leonardo contou com a ajuda do elenco adulto nessa transição e uma delas foi a de Cleto Baccic, intérprete de Willy Wonka. O ator, escalado antes da pandemia para viver o icônico chocolateiro, descobriu que o musical retornaria assim que desembarcou na Coreia do Sul para visitar seu filho.
Baccic ficou surpreso e também preocupado, pois encarar o isolamento não foi nada fácil para ele. “A gente achava que realmente eram 15 dias, mas logo vimos que não seria assim e, depois de 20 dias, notamos que só seria possível voltar com a vacina. Eu fiquei na ‘bad’, fiz buraco no sofá. Foi muito ruim para mim, cai numa ‘deprê’, fiquei mal e cheguei a engordar 16 kg. Comecei a melhorar depois de alguns meses quando entrei em um aplicativo e comecei a fazer shows e interagir virtualmente com pessoas de outros países, ganhei fãs até na Ásia.” O ator teve Covid-19 nesse período, e problemas de memória e distúrbio do sono foram algumas das sequelas. O medo dele era não ter fôlego para esse retorno aos palcos. “O musical é muito cansativo para mim, no segundo ato eu não saio de cena. Retomar esse fôlego foi difícil, tive medo de não dar conta, tenho 51 anos. Foram horas e horas de ensaio, então quando estreou já estava tudo ok.”
Fonte: Jovem Pan