‘Enquanto Lira for presidente da Câmara, veremos briga nos bastidores do Congresso’, diz Kajuru

Senador de primeiro mandato, Kajuru se notabilizou pela franqueza com que se posiciona sobre os mais variados temas

Jornalista com mais de 30 anos de experiência, Jorge Kajuru (Podemos-GO) chegou ao Senado nas eleições de 2018 e se notabilizou pela franqueza com que se posiciona sobre os mais variados temas e pela combatividade de seu mandato. Ao lado do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), o parlamentar foi um dos responsáveis pela instalação da CPI da Covid-19, que apurou as ações e omissões do governo do presidente Jair Bolsonaro no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus – o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu uma decisão liminar em ação movida pela dupla no início de abril. Nesta entrevista exclusiva à Jovem Pan, Kajuru criticou o que chama de “retórica antivacina” do chefe do Executivo federal, falou sobre as articulações do ex-juiz Sergio Moro, pré-candidato à Presidência da República e seu mais novo correligionário, e subiu o tom contra as emendas de relator, conhecidas como orçamento secreto. Para o ano de 2022, o relator-geral do Orçamento, Hugo Leal (PSD-RJ), prevê R$ 16,5 bilhões em recursos desta natureza. “O orçamento secreto de Bolsonaro é muito pior que o Mensalão. É um crime inaceitável, é escandaloso. Para mim, tinha que ter punição, condenação. Não tem cabimento você comprar voto dessa forma. Todo mundo vê e sabe como funciona, basta acompanhar o voto dos colegas. O tamanho não se compara com o Mensalão. Em 2022, o orçamento secreto será maior, porque é ano de eleição. No mundo em que vivemos, não há almoço grátis. Mas este é o almoço mais caro que eu já vi”, disse à reportagem. Confira abaixo os principais trechos da entrevista: 

Datafolha e Ipec apontaram, nas últimas pesquisas, uma possível vitória do ex-presidente Lula no primeiro turno no ano que vem. O senhor costuma dizer que o antipetismo foi fundamental para a eleição de Bolsonaro. Uma eventual vitória do PT contra Bolsonaro simbolizaria o fracasso da gestão do presidente da República? Com relação às pesquisas, eu só acredito no Datafolha. Conheço o instituto, trabalhei na Folha de S. Paulo e sei que qualquer resultado trazido por eles é confiável. O Datafolha também diz que, para 48% dos brasileiros, Bolsonaro é o pior presidente da história. Se a eleição fosse hoje, [a derrota para o PT] significaria isso mesmo. Quatro anos depois de Bolsonaro ganhar uma eleição impulsionado pelo sentimento anti-PT, ele seria derrotado pelo sentimento anti-Bolsonaro. São as voltas que o mundo dá. O antibolsonarismo, hoje, é muito grande.

Como o senhor vê a possível aliança entre Lula e Alckmin? O ex-presidente Lula só tem chance de vitória se conseguir unir parte da terceira via, se conseguir unir nomes valorosos e reconhecidos. E é o que penso do Geraldo Alckmin. Eu o considero um ótimo quadro que o PSDB perdeu. Agora, se puder se unir ao Lula, vai ser bom para os dois. É o tipo da dobradinha que é boa para os dois. Mas, temos que esperar um pouco mais, porque até março os pré-candidatos vão mostrar a que vieram. Se nenhum nome da terceira via chegar a 20% até março, a eleição ficará polarizada entre Lula e Bolsonaro. Por isso, todos têm que saber escolher o seu vice.

O Podemos, partido do senhor, filiou o ex-juiz Sergio Moro, o ex-procurador Deltan Dallagnol e convidou o ex-procurador Rodrigo Janot para entrar no partido. O senhor teme que a legenda se torne o alvo preferencial daqueles que afirmam que a Lava Jato tinha um objetivo político? Absolutamente, não. De maneira alguma. Isso é opinião de gente que foi investigada pela Lava Jato. Pessoas e políticos de bem têm que respeitar o trabalho da Lava Jato. Eu entendo sua colocação, mas não concordo. O Podemos não pode ser atacado por isso. O Podemos apoiou a Lava Jato em todos os sentidos. Aceitar em seus quadros nomes como Moro e Deltan é uma demonstração de que o partido é independente e seríssimo.

Adversários de Moro dizem que ele não tem nada a oferecer além da promessa de combate à corrupção. Como o senhor avalia os primeiros movimentos do ex-juiz enquanto pré-candidato à presidência? As pessoas precisam entender que o homem público Sergio Moro não entraria numa disputa sem preparo para qualquer pauta. Ele prepara um projeto de governo, está ouvindo as pessoas com humildade. Não tenho nenhuma dúvida de que o presidenciável Sergio Moro terá todo o programa de governo pronto até março. Não se pode deixar de votar em Moro por achar que ele não vai priorizar o combate à fome, à miséria, ao desemprego, aos aumentos nos preços da energia, da gasolina, etc. É evidente que ele está pensando em tudo isso.

O Podemos avançou em um acordo com o União Brasil no sentido de dar ao novo partido a prerrogativa de indicar o vice na chapa de Moro. O nome do deputado federal Luciano Bivar é um dos mais cotados. Como avalia isso? Se Moro quer se apresentar como um outsider, como justificar a escolha de uma figura que está há anos na política? Isso tem sido só conversado, mas não há nada decidido. Ter o União Brasil contigo na disputa pela presidência traz um ganho que você não pode questionar. É um partido que agrega em horário de TV, em palanques. Daí a colocar um vice-presidente que obrigatoriamente seja do partido, não concordo. Respeitarei a decisão, mas não concordo com o nome do Bivar. Dentro do DEM, há um nome melhor, que é o do ministro Mandetta. Bivar é um político de carreira, não é a cara de uma chapa de Sergio Moro.

Em 2018, Bolsonaro se elegeu prometendo combater a corrupção, dar fim ao toma-lá-dá-cá e defendendo pautas conservadoras. De lá para cá, Moro saiu do governo, a liderança do governo foi entregue a Ricardo Barros, nome do Centrão, e o presidente se filiou ao PL, do núcleo duro do Centrão. O que ele tem a oferecer ao eleitor em 2022? Mais uma vez, digo que Bolsonaro foi eleito exclusivamente por ter se apropriado da imagem do antipetismo. Não acho que estes pontos que você elencou tenham sido fundamentais, porque isso tudo é uma grande mentira. Bolsonaro integrou o PP, do Centrão, por mais de 10 anos. O governo dele colocou em prática o maior toma-lá-dá-cá desde os tempos de Sarney. No mais, empilhou promessas mentirosas, como ser contra a reeleição. Ele trabalha pela reeleição desde o dia um de seu governo. E é uma concorrência desleal, porque, estando na presidência, usa dinheiro público para fazer campanha e agradar aqui e acolá. Bolsonaro não tem mais nada a oferecer. Perdeu os bons ministros por ciúmes, porque via em cada um deles um potencial adversário no futuro. Em 2022, tomará medidas populistas para tentar reverter um quadro muito ruim.

Em 2021, Câmara e Senado entraram em rota de colisão diversas vezes. A última delas, na PEC dos Precatórios. A que o senhor atribui isso? Desde os tempos de Rodrigo Maia [antecessor de Arthur Lira na Presidência da Câmara], o que a Câmara deseja é ser comandante e protagonista de todo o Congresso. Os deputados querem que o Senado seja um office boy de luxo da Câmara, apenas para carimbar as coisas. Há momentos em que nos revoltamos porque alguns projetos chegam com prazo de votação de 24 horas. O presidente Rodrigo Pacheco sabe que isso tem que acabar, mas eu não acredito em mudança nenhuma. Enquanto Lira for presidente, vamos ver somente essa briga de bastidores, com o Lira querendo mostrar que quem manda é ele. Do jeito que está, não vai mudar nada. Tentaremos lutar.

Como um dos responsáveis pela instalação da CPI da Covid-19, como o senhor avalia a postura do procurador-geral Augusto Aras? O procurador, desde antes da CPI, mostrava ser o Geraldo Brindeiro dos novos tempos. Na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, Brindeiro era considerado o maior engavetador. Aras mostra a mesma cara, é carimbador de coisas sérias, como é o caso da CPI. Olha o tanto de elementos e provas que a comissão conseguiu reunir e estamos vendo o que está acontecendo. Nada do que a CPI mostrou chegará ao presidente Bolsonaro. Até acredito que vão pegar e condenar um lambari ou outro, mas os tubarões continuarão nadando no aquário.

O que o senhor pensa sobre o orçamento secreto? É um Mensalão 2.0? O orçamento secreto de Bolsonaro é muito pior que o Mensalão. É um crime inaceitável, é escandaloso. Para mim, tinha que ter punição, condenação. Não tem cabimento você comprar voto dessa forma. Todo mundo vê e sabe como funciona, basta acompanhar o voto dos colegas. O tamanho não se compara com o Mensalão. Em 2022, o orçamento secreto será maior, porque é ano de eleição. No mundo em que vivemos, não há almoço grátis. Mas este é o almoço mais caro que eu já vi.

O presidente Bolsonaro voltou a atacar ministros do STF. Quanto isso o desgasta para 2022? Para mim, essa retórica é como uma torcida organizada, um Fla-Flu. Só os fanáticos e os alienados aplaudem isso. É por isso que existem pesquisas sérias mostrando que sete a cada dez eleitores não votariam em Bolsonaro.

A Anvisa aprovou a vacinação de crianças, o presidente Bolsonaro disse que gostaria de divulgar o nome dos diretores responsáveis pela autorização e o ministro Marcelo Queiroga afirmou que ‘a pressa é a inimiga da perfeição’. Como o senhor avalia isto? Essa retórica antivacina é lamentável. Como eu sempre digo, a ignorância é a maior multinacional do mundo. Bolsonaro desinforma e Queiroga tem má vontade com um assunto sério. Como o ministro da Saúde diz que a pressa é inimiga da perfeição em um assunto como este? Esperar até 5 de janeiro para tomar uma decisão? Isso é muito triste. Ultimamente, não tenho perdido meu tempo para ouvir o que Queiroga fala.


Fonte: Jovem Pan

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