‘O Islã garante mais proteção à mulher do que qualquer lei social’, diz brasileira muçulmana

Flávia Martinelli, Mariam Chami e Carima Orra contam como é a vida das muçulmanas no Brasil

Assim como uma parte considerável dos brasileiros, Flávia Martinelli, 35 anos, acreditava que o islamismo era uma religião que discriminava as mulheres. A capixaba de Vitória começou a mudar de opinião em 2011, quando foi fazer mestrado em Direito nos Estados Unidos e conheceu alguns muçulmanos. Apesar de ser bastante ativa na Igreja Católica, a fé dos seus novos colegas chamou atenção: eles rezavam cinco vezes ao dia, jejuavam durante o mês do Ramadão, que é um período sagrado para eles, se abstinham de comer carne de porco e não tomavam bebidas alcoólicas. Intrigada, ela começou a estudar o Alcorão, o livro sagrado do Islã. “Eu queria provar que eu estava certa e eles, errados. Eu queria fazer uma espécie de estudo comparado. Nunca imaginei que aquilo acabaria fazendo tanto sentido para mim. Encontrei respostas racionais para muitas dúvidas que eu tinha na época”, conta. A decisão de se converter, no entanto, não veio de uma hora para a outra. Flávia passou um ano estudando aquela nova religião antes de ir a uma mesquita em 2013 e recitar o Chacado, o primeiro dos cinco pilares do islamismo: “Não há outro deus além de Alá e Maomé é seu profeta”. Depois disso, a advogada esperou mais dois anos para começar a usar o hijab, o véu que emoldura o rosto e cobre o cabelo de algumas mulheres muçulmanas. “Eu morava com os meus pais e queria dar mais tempo para eles se acostumarem, então fui fazendo uma mudança gradual de vestimentas e, aos poucos, fui me sentindo mais forte e preparada para usar o hijab”, explica.

Além do véu, as muçulmanas costumam adotar a chamada “moda modesta”, que está em alta entre mulheres de todo o mundo, independente da religião. Da elitizada Dolce & Gabanna à acessível H&M, diversas marcas internacionais começaram a fazer roupas que cobrem a maior parte do corpo feminino e, ao mesmo tempo, seguem as últimas tendências internacionais. Para que a muçulmana não seja impedida de se exercitar em ambientes públicos, existem modelos de hijab específicos para nadar e praticar outras atividades esportivas, como os que foram lançados pela Nike em 2017 com tecidos mais leves e respiráveis. No entanto, algumas mulheres optam por simplesmente não seguir a regra do uso do véu – e isso não as torna menos muçulmanas. “O hijab é só uma de várias práticas religiosas. Para mim, ele faz parte da construção da minha identidade. Eu quero que as pessoas saibam que eu sou muçulmana. E a mulher que usa o véu no Brasil também está enfrentando o preconceito”, afirma. Em 2015, Flávia se casou com um muçulmano, com quem teve um filho. O relacionamento acabou não dando certo e eles optaram por pedir o divórcio, que é permitido pelo islamismo em último caso após a tentativa de reconciliação. A advogada, que trabalha no Ministério Público, ficou com a guarda da criança e ainda pode se casar novamente dentro da religião. “O próprio profeta Maomé se casou com Cadija, que tinha ficado viúva de um primeiro marido e decidido se divorciar de um segundo”, exemplifica.

Namoro, casamento e sexo, necessariamente nessa ordem

A vida de Mariam Chami, 30 anos, exemplifica bem a trajetória de muitas brasileiras que nasceram dentro de famílias muçulmanas e tem a sua nacionalidade questionada o tempo todo. A paulistana é filha de um imigrante libanês muçulmano e de uma brasileira de família cristã que acabou se convertendo ao islamismo após o matrimônio. “Eu sou descendente de índio. A minha bisavó é índia. Dá para ser mais brasileira que eu? ”, questiona Mariam no Instagram, onde acumula 416 mil seguidores. Ela conta que começou a usar o hijab aos 14 anos, logo após sua primeira menstruação. Para o islamismo, a menarca marca a transformação da menina em mulher e a necessidade de cobrir partes consideradas íntimas, que no corpo feminino são tudo menos o rosto e as mãos. Como grande parte das meninas brasileiras, a paulistana frequentou o colégio, prestou vestibular e entrou na faculdade. Começou a estudar Nutrição aos 17 anos e tirou a sua carteira de motorista aos 19. Isso porque, ao contrário do que muitos pensam, o Alcorão é um grande incentivador da busca pelo conhecimento e estabelece o estudo como um dever de todo muçulmano, seja ele homem ou mulher. “Procurem a sabedoria do berço até o túmulo”, ordena o livro sagrado. Além disso, os muçulmanos se orgulham de a universidade mais antiga do mundo ter sido fundada dentro de uma mesquita no Marrocos por uma mulher, a princesa Fatima al-Fihri.


Fonte: Jovem Pan

Comentários